Paloma Galvão
Breve história do amor

A forma como enxergamos o amor é uma construção sócio-histórica, ou seja, o amor é um produto de sua época, é socialmente construído, não é algo já estabelecido, refletindo um momento histórico.
Falando de uma perspectiva ocidental, o conceito de amor está relacionado ao de família. No século 17 tudo era público, as crianças eram vistas como mini adultos, não havia o conceito de propriedade privada, que só surgiu no século 18 com a construção do conceito de família burguesa. A família burguesa era composta por um casamento arranjado, por conveniência, e passou-se a dar mais atenção ao cuidado com as crianças.
Nesse modelo de família, agora associada a ideia de casa e propriedade privada, também existia um aprisionamento feminino, já que a esposa vem pra dentro desse espaço privado, e passa a ser vista como ameaça à sociedade privada – afinal, só pode estar com apenas um homem, assim se tem certeza de que o filho é dele.
E o amor romântico, onde está, afinal?
O conceito de amor romântico surge no século 19 para se libertar desse casamento por conveniência, porém é uma libertação apenas para os homens. Constrói-se o mito de um amor doméstico, puritano, casto, controlado e cauteloso, sob medida para a classe média. O amor romântico do século 19 é calcado por uma idealização de como homem e mulher devem se comportar. Porém, estereótipos de gênero são fortalecidos nesse modelo de relacionamento, já que os homens ficam livres para escolher a mulher que querem, enquanto as mulheres passam a ter seus direitos fragilizados. Impera a visão do homem como patriarca e a mulher como pessoa casta que deve se guardar para o homem que virá salvá-la. A virgindade se transforma em um objeto de valor econômico e político. Se impõe à mulher uma monogamia compulsória e a família monogâmica garante a transmissão da herança gerada pela acumulação de bens do sistema capitalista.
No século 20, esse conceito se mantém ao falarmos de família nuclear monogâmica, considerada o símbolo da felicidade, casa-se por amor e nasce o mito da metade da laranja.
Percebeu que o único modelo de casal citado neste texto é entre um homem e uma mulher? Isso ocorre porque a ideia de amor romântico não é para todos, pois é um modelo idealizado, patriarcal, heteronormativo e monogâmico (monogamia compulsória).

No século 21, surgem algumas movimentações sobre esse tema, com questionamentos decorrentes da revolução sexual, entre eles:
• Casamento deixou de ser visto como uma decisão eterna,é possível se divorciar;
• Mudam os estereótipos de gênero com a inserção da mulher no mercado de trabalho;
• O surgimento da pílula anticoncepcional permitiu liberdade financeira e sexual para as mulheres;
• Com tantas opções de vida, os objetivos dos indivíduos se dividem entre a liberdade, a estabilidade e a incerteza entre elas;
• O amor romântico começa a sair de cena, levando com ele a ideia de exclusividade;
• Diversas alternativas de se relacionar surgem (relacionamento aberto, relações livres, não monogamia, etc).
Com tais questionamentos sobre o amor romântico, novas formas de se relacionar passam a ser consideradas, sendo assim, um reflexo de seu tempo, corroborando o que foi falado no início desse texto, o amor é construído de forma sócio-histórica.
Paloma Galvão
Psicóloga e Terapeuta de casais